Tantas coisas que me lembram de tio ventoa chuvaas ruasas pedras nuas
onde me sento
o olhar de um casal
um simples gesto
um sorriso
quase desapercebido
um livro
a barra esvoaçante de um vestido
um sino tocando
uma ave voando
Há tantas coisas
(erradas eu sei)
que me lembram
o quando te amei
e as estradas que calcorreei
para te ver chegar
Vivo no limite!No excesso da gargalhadada dorda paixãoSou intensa
e quando amo
faço-o com a generosidade
de quem planta uma flor
e gosta de a ver crescer e florir
Talvez por isso
tanta vez me sinto no abismo
no limite das forças
e do bem querer
Mas ser assim está nos meus genes
e saber perdoar e acarinhar
uma flor que não floriu, também!
Pensei morrer, senti de perto o frio, e de quanto vivi só a ti eu deixava:
tua boca era o meu dia e minha noite terrestres
e tua pele a república fundada por meus beijos.
Nesse instante se terminaram os livros,
a amizade, os tesouros sem trégua acumulados,
a casa transparente que tu e eu construímos:
tudo deixou de ser, menos os teus olhos.
Porque o amor, enquanto a vida nos acossa,
é simplesmente uma onda alta sobre as ondas
mas ai quando a morte nos vem tocar a porta
só existe teu olhar para tanto vazio,
só a tua claridade para não seguir sendo,
somente o teu amor para encerrar a sombra.
PABLO NERUDA
